segunda-feira, março 26, 2007

Luís Castro

"O objectivo é formar jogadores à Porto"

TOMAZ ANDRADE


Depois de uma carreira pouco brilhante como jogador, Luís Castro enveredou pela carreira de treinador, passando a ser mais conhecido com o trabalho desenvolvido no Penafiel. Há cinco meses foi convidado para dirigir a formação do FC Porto e os primeiros reflexos começam a aparecer.

A subida de Castro ao plantel principal do FC Porto pode ser já entendida como resultado da reestruturação da formação do clube?
Acho que é a continuação de um processo. Mas hoje em dia, da forma como o futebol está e é encarado, está-se a dar um pouco mais de visibilidade a todos os que saem da formação. É um olhar diferente sobre o fenómeno.

Talvez porque se fala mais de jogadores que saíram há pouco das equipas de base, sendo o Sporting o exemplo maior?
Talvez. A Selecção Nacional de Sub-19 tem entre sete e oito jogadores do FC Porto, o que quer dizer que a formação do clube tem sido feita com qualidade. Tenho de dizer que procuro dar um cunho pessoal ao processo de formação. É uma realidade que os jogadores do FC Porto são uma presença assídua nas selecções e estavam até aqui num processo diferente daquele que é encarado por outros clubes, que os fazem subir de forma directa para a equipa A. O FC Porto tinha outro caminho, que era o de pegar nos jogadores em fase de transição e colocá-los noutros clubes, e vamos continuar a fazê-lo, de maneira a que atinjam um estado de maturação. Temos jogadores no Leiria, Portimonense, Académica, Tourizense, em diferentes níveis para atingirem determinados estados de maturação.

É caro formar um jogador em Portugal?
É um esforço muito grande. Não sei quantificar em números, mas é caríssimo, embora fique claramente mais em conta do que ir contratar a outro lado. Ao formarmos, fazemo-lo com a nossa identidade, cultura, com aquilo que entendemos que deve ser um jogador à Porto. É esse jogador que queremos formar.

O que é um jogador à Porto?
Será sempre um jogador agressivo, com uma ambição muito grande, bem posicionado em campo, com transições fortes, bem dotado tecnicamente e com grande espírito de sacrifício.

"Trabalhámos nas posições deficitárias"


Há uma articulação entre a formação e a equipa principal no sentido de ser trabalhado um determinado modelo de jogo?
É nossa intenção dotar os jogadores com uma cultura própria para fazer face a todos os sistemas tácticos. Era muito redutor preparar um jogador para um único sistema. Não faz sentido. O fundamental é que seja portador de todos os princípios de jogo necessários à inserção em qualquer modelo. E os jogadores do FC Porto estão preparados para isso.

Será que se pode falar de um laboratório na formação tendo em conta as necessidades da equipa principal?
Podemos e vai-se fazer. Sabemos que Portugal está deficitário em defesas-esquerdos, pontas-de-lança. Há um gabinete no FC Porto que é fundamental em todo este processo e que tem sido um grande apoio para a formação, que é o gabinete de prospecção e observação, que tem detectado valores para esses lugares que no futuro achamos que servirão o FC Porto.

O clube tem um gabinete pedagógico. Como funciona?
Há jogadores que manifestam problemas, desde o foro emocional a frustrações, e têm acompanhamento. Esse gabinete é formado por um director pedagógico, três psicólogos e um assistente social. Problemas escolares, de isolamento e que são detectados pelos treinadores são direccionados para esse gabinete, que funciona muito bem.

Quais são os jogadores da formação que estão mais perto de subirem ao plantel principal?
Há jogadores que estão a trabalhar na equipa principal [Ventura e Castro] e isso são claros sinais dessa proximidade. Mas nem todos vão subir, é uma percentagem diminuta.

Que percentagem?
Talvez dez por cento. Mas estou mais preocupado com a qualidade que possam ter para desenvolverem a profissão no futuro.

Os dirigentes falam em apostar na formação e em muitos casos os efeitos práticos são nulos...
No FC Porto há uma estratégia definida. Mas o jogador só pode subir à equipa principal se tiver qualidade. Estarmos a forçar uma subida para efeitos estatísticos não é bom. A cultura Porto é de vitória. É impensável estarmos 18 anos e ter um ou dois títulos. Pode acontecer a outros clubes, para nós é impensável. Temos de fornecer qualidade.

Para subir ao plantel principal

Qualidade é fundamental


No passado, o FC Porto optou mais pela distribuição de jogadores por vários clubes quando estes acabavam o processo de formação de base, mas agora a tendência começa a ser invertida. As subidas ao plantel principal são mais frequentes. "Este ano podemos colocar um ou dois jogadores e para o ano não colocar nenhum. Vai depender sempre da qualidade do jogador. Não queremos fazer isto de uma forma forçada. Queremos é que haja uma confiança absoluta do treinador no fornecedor, no caso a formação do FC Porto. Queremos um jogador com uma determinada identidade, que achamos que deve ter para jogar na equipa A, e que o treinador tenha confiança na formação", esclareceu Luís Castro.

Para André Castro evoluir melhor

Acompanhamento técnico e psicológico


O médio Castro é o nome mais recente no plantel principal oriundo da formação. Depois de atingir esse patamar, um jogador não é esquecido. "Damos-lhe um acompanhamento para que possa desenvolver as suas capacidades. Vai haver uma adaptação gradual à equipa A para que quando for utilizado possa estar identificado com um processo novo. Este processo é acompanhado por vários departamentos que estão adjacentes a este trabalho, como o departamento pedagógico, a equipa médica e a direcção técnica", explica Luís Castro.

"Queremos recrutar jogadores com menos de 14 anos"


Como se detecta um jogador?
Um bom jogador é aquele que joga com todas as partes do corpo, ágil, veloz e tecnicamente evoluído. Com estas características percebemos que há um talento, depois é ver se serve mais a defesa, o meio-campo ou o ataque.

E onde se vai buscar um jogador assim?
Temos uma rede de observadores espalhada pelo país, denominados observadores locais, que passam a informação para o gabinete de prospecção e observação. Desencadeia-se assim o processo, apertando a malha até ao recrutamento. Cada vez menos vamos buscar jogadores para além dos 14 anos. Queremos recrutá-los em idades mais baixas e dar-lhes a nossa identidade.

É frequente haver erros de avaliação, aparecendo jogadores em outros clubes que tenham sido rejeitados pelo FC Porto?
Para vir para o FC Porto um jogador vai dar alguma coisa. Pode é haver uma estagnação. Para jogarem têm de perceber o jogo. Há alturas em que percebem-no e é aí que sentimos que dão o passo em frente.

Educação é fundamental


A par da formação, o FC Porto investe também na educação. O conceito é absolutamente essencial para o director técnico da formação portista. "Não concebo dentro do clube um jogador, seja em que idade for, que não estude. É impensável. Os jogadores Porto estudam todos. O meu objectivo enquanto director da formação é que quando esteja em idade de transitar para a equipa principal esteja à beira da universidade, no 12º ano. Sabemos que podem falhar a ascensão mas têm que ter alguma coisa. Um jogador social e culturalmente evoluído será sempre melhor, ao passo que um apenas com a componente técnica será muito frágil".

Físico não conta
Prioridade à parte técnica e táctica


Na formação de um jogador há duas componentes essenciais: a técnica e a táctica. Ao contrário do que possa parecer, a parte física não é essencial, ao contrário do sugerido por José Mourinho quando era treinador do FC Porto, exigindo laterais altos. "Há dois factores de rendimento que estão no topo, que são o técnico e o táctico. Não há problemas quanto à parte física. Na formação não olhamos à altura. O próprio jogo dá essa componente física. A parte psicológica também é fundamental", diz o director técnico da formação.

in o JOGO

Publicado em Porto em Formação